22 de dez. de 2010

Waldkindergarten: quando a floresta vira sala de aula

Não há cadeiras, mesas, nem quadro negro. Em algumas escolas primárias da Europa, os alunos passam o dia todo na floresta. São os chamados Waldkindergarten ou jardins de infância na floresta. Para pesquisadores, as crianças que vão para esses colégios apresentam maior criatividade e capacidade para solucionar conflitos



  
Seja um dia ensolarado, chuvoso ou com neve, é sempre a mesma rotina. Os pais dão adeus aos filhos e os pequenos se embrenham no meio da mata junto com seus professores. Os Waldkindergarten (jardim de infância na floresta, em alemão) surgiram nos países escandinavos há mais de 60 anos. Logo a ideia se espalhou pela Alemanha, onde, atualmente, estima-se que existam cerca de 300 escolas desse estilo. Dinamarca, Suécia e Suíça são países onde os Waldkindergarten também se tornaram bastante populares, principalmente nos últimos dez anos, quando houve um boom de pais optando por ter seus filhos em maior contato com a natureza.


Os Waldkindergarten recebem crianças entre dois e seis anos. Para os menores, as escolas não seguem nenhum currículo específico, mas a partir dos 4 anos, os professores devem obedecer às mesmas exigências do currículo das escolas públicas oficiais para essa faixa etária. Na maioria dos Waldkindergarten, os educadores misturam conceitos das várias linhas pedagógicas existentes – tradicional, construtivista e, principalmente, a montessoriana, na qual a criança deve ser incentivada a aprender por conta própria. Entretanto, já existe também a Naturpädagogik (pedagogia da natureza, em alemão), teoria que faz parte do currículo de algumas universidades, principalmente na Alemanha.

As escolas se diferenciam pela estrutura física. Algumas tem uma sede, perto da floresta, onde as crianças passam algumas horas do dia, fazendo atividades internas. Outras montam cabanas ou pequenos abrigos dentro da mata. Em muitas há o Waldsofa, uma estrutura em forma de círculo, feita com galhos de madeira, lembrando uma mesa redonda com pequenos troncos de árvore servindo de bancos. É no Waldsofa que os pequenos almoçam, em volta do fogo, onde a comida é cozida, ali mesmo, ao ar livre. Mas, nem por isso, o ambiente rústico deixa as regras de boas maneiras de fora. As crianças só começam a comer depois que todos os amigos são servidos e só se pode levantar quando todos terminam.

Existem Waldkindergarten nos quais os pequenos até tiram a sonequinha da tarde embaixo das árvores. E lógico, não poderia deixar de haver um banheiro. Escondidas discretamente entre as árvores, toras de madeira são amarradas para formar um “assento”. Lá mesmo, as crianças fazem as necessidades, sem constrangimento ou vergonha, afinal, tudo aqui é muito natural.

Diariamente os alunos passam de cinco a seis horas por dia na floresta. São caminhadas de aproximadamente dois quilômetros. Munidos de mochilas nas costas, eles sempre carregam uma bebida quente nos dias de inverno e um repelente no verão. As crianças só não vão para a floresta quando há alguma situação perigosa. “Quando há muita neve, por exemplo, o gelo pode cair das árvores mais altas e machucar alguém”, diz Marga Keller, pedagoga e diretora da escola Wakita, com 80 alunos, em Zurique, na Suíça. “Fora isso, nada impede de levarmos as crianças para fora. Elas aprendem a lidar com situações extremas e isso é ótimo para seu desenvolvimento”.

É um processo de aprendizado e exploração contínuo. “Eles aprendem muito através do próprio corpo, descobrindo novas sensações – tocando, cheirando, ouvindo os sons da floresta”, afirma Marga. “As crianças aprendem, também, a superar os próprios limites.

Nunca carregamos ninguém para subir numa pedra ou atravessar um riacho. Eles fazem isso sozinhos, estamos ali para incentivá-los e mostrar o melhor caminho”, explica.

O processo educacional depende muito do que o grupo vai encontrar na mata durante o dia. A discussão pode girar em torno de um animal qualquer, uma árvore caída ou as folhas mudando de cor. Tudo o que se vê na natureza é contextualizado. No inverno, por exemplo, noções de matemática podem ser aprendidas através da espessura da neve, já a condensação da água em gelo faz parte da química e a biologia pode ser ensinada mostrando a cadeia alimentar dos animais encontrados na floresta.

Pesquisas mostram que crianças que brincam ao ar livre tem maior disposição física, poder de concentração e vontade de experimentar o novo. A pegadoga e psicóloga Sarah Kiener, da Universidade de Freiburg, na Suíça, fez um estudo comparando as habilidades de alunos que frequentavam jardins de infância tradicionais e os Waldkindergarten. “O contato com a natureza melhora o desenvolvimento motor, o poder de concentração, a criatividade, o comportamento social e ainda dá mais resistência imunológica”, revela Sarah. A pesquisa mostrou, ainda, que essas crianças ganham maior resistência física, brincam mais sozinhas e despendem mais tempo num só jogo ou brincadeira, além disso, sempre buscam maneiras diferentes de atingir um objetivo. Entretanto, alguns estudos mostraram que alunos de Waldkindergarten não têm a motricidade fina tão desenvolvida.

A experiência perto da natureza também traz ganhos para a formação da memória sensorial dessas crianças. “Ao crescer, elas terão maior facilidade com o aprendizado intelectual e o pensamento abstrato”, afirma a pedagoga.

Mas não é toda criança que se encaixa perfeitamente nesse tipo de escola, por isso, há um período de adaptação. “As crianças precisam gostar de estar ao ar livre e se divertir nesse ambiente. Há muita sujeira ou, então, dias de frio intenso. Para continuar no Waldkindergarten, o aluno precisa estar feliz com a experiência”, salienta Marga. E quem são os pais que procuram esse estilo de ensino mais alternativo para os filhos? “Artistas, professores, intelectuais ... Gente com a mente mais aberta e que, geralmente, já gosta de passar finais de semana ou as férias em meio à natureza”, conta a diretora da escola Wakita.

A dinamarquesa Linda Stavast é mãe de dois meninos, um de quatro anos e o mais velho com seis. Já havia ouvido falar sobre Waldkindergarten na Dinamarca, especialmente em Copenhague, onde morava. Quando mudou para a Suíça, decidiu matricular os filhos em um jardim de infância na floresta. “Acho importante para as crianças brincarem ao ar livre e aprenderem sobre a natureza. Meus filhos adoram os dias na floresta. O melhor de tudo é que, depois de um longo dia de exercícios, os dois comem um belo jantar e estão loucos para ir para a cama”, brinca Linda.

Entretanto, muitos pais questionam educadores se, depois de tanta liberdade e atividades ao ar livre, alunos de Waldkindergarten conseguirão se adaptar entre quatro paredes, ou seja, dentro das salas de aula tradicionais. “Com certeza, eles estão prontos para uma nova experiência e querem explorar mais o lado intelectual”, garante Marga Keller.






Suzana Camargo, da Suíça – Edição: Mônica Nunes

Planeta Sustentável – 29/01/2010










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